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O Luxo das Borbulhas

Os espumantes Chandon, do conglomerado de luxo LVMH (Louis Vuitton Moët Hennessy) não são produzidos apenas na França. Há também subsidiárias na Austrália, nos Estados Unidos (Califórnia), no Brasil (Garibaldi, no Rio Grande do Sul) e na Argentina, no Valle de Uco, em Mendoza. É dessa última que trago informações preciosas sobre os bastidores do nascimento da bebida oficial das comemorações.

É nas plantações que se apresenta a primeira curiosidade sobre o assunto. Há roseiras plantadas próximas às videiras. E, apesar de lindas, sua função é de proteção. Extremamente sensíveis, elas morrem ou adoecem rapidamente na presença de pragas, o que alerta os produtores em caso de perigo. O exame laboratorial dessas roseiras doentes permite a identificação da praga e a escolha do defensivo adequado para salvar as videiras a tempo.

A Chandon tem mais de mil hectares de vinhedos em Mendoza em altitudes de 900 a 1700 metros, pois as melhores uvas para a produção dos espumantes, aquelas mais ácidas e com menos açúcar, crescem em terras mais altas. Pelo mesmo motivo, essas colheitas acontecem em janeiro e fevereiro, enquanto uvas destinadas a vinhos “tranquilos”, sem borbulhas, são colhidas entre março e maio. Quanto mais tardia é a colheita, mais açúcar haverá nas frutas.

Os espumantes Chandon têm sempre uvas chardonay e o pinot noir como base. Porém, para as variações rosé, a marca adota, em cada país produtor, a melhor uva local como complemento. Dessa forma, além da coloração rosada, esses vinhos ganham sabor personalizado, o que, na Argentina, acontece com um toque de Malbec.

Outra uva que entra na composição dos espumantes Chandon é a sémillion. Muito doce e geralmente usada para elaborar vinhos de colheita tardia, essa uva é destinada, na Chandon, à produção de licor de expedição, que dá aos borbulhantes as diferentes gradações de doçura que resultam em versões como Brut, Extra Brut, Demi Sec, entre outras.

O processo de produção dos espumantes é complexo. Depois da colheita e prensa das uvas e de uma primeira fermentação, os chamados “vinhos base” de chardonay e pinot noir, sem borbulhas, são armazenados separadamente, em tanques de aço inoxidável. É então que entra em ação o chef du cav. Ao chef da vinícola, cabe elaborar a mistura dos vinhos base, que determina o sabor do produto final. Nas Bodegas Chandon Mendoza, esse profissional está no cargo há quarenta anos e seu contrato é vitalício, pois está em suas mãos o segredo dos espumantes da casa. Isso porque os vinhos base não são misturados em duas partes de 50% cada e nem há uma “receita” invariável a seguir. De acordo com a colheita de cada ano, o sabor dos vinhos base se altera e cabe ao chef buscar o equilíbrio que garanta o resultado padrão das bebidas, independente de variações entre as safras.

Em seguida, esse mix ganha leveduras e 2% de açúcar e é engarrafado. As leveduras, além de promoverem uma segunda fermentação, aportam sabores e aromas à bebida durante 25 dias, ao fim dos quais as leveduras morrem e se depositam no fundo das garrafas. Reposicionadas na horizontal, elas passam a ser giradas diariamente em rotações de um quarto de volta para a esquerda e para a direita, alternadamente, enquanto vão sendo gradualmente inclinadas com as rolhas apontadas em direção ao chão. Dessa forma, as leveduras se depositam junto à tampa ao final de um período que pode variar de seis meses a seis anos na Argentina e chega a treze anos na França.

É necessário, então, retirar as leveduras mortas para garantir a transparência da bebida. Para isso, a “máquina de degola” submerge os gargalos num líquido chamado glicol resfriado a 25 graus negativos, o que congela as impurezas acumuladas junto à tampa. Em seguida, colocadas de pé, as garrafas têm as rolhas retiradas e as próprias borbulhas se encarregam de expulsar as leveduras congeladas. Rapidamente, outra máquina injeta o licor de expedição para adoçar o espumante e as garrafas são novamente arrolhadas e armazenadas por um período de mais seis a oito meses.

Caso esse processo aconteça em garrafas, denomina-se champenoise, método mais tradicional, que leva no mínimo seis anos para se completar e do qual resultam espumantes de sabor mais complexo ao paladar. É através dele que se elabora o champagne francês. Se o ciclo se der em tanques, trata-se do método charmat, que é mais rápido, permitindo espumantes prontos em oito meses, e de sabor mais refrescante e frutado.

Deve-se creditar a transparência dos espumantes que conhecemos a Barbe-Nicole Ponsardin, que dá nome aos champagnes Veuve Clicquot. No século XVIII, a jovem viúva de François Clicquot herdou dele uma vinícola. Como à época era inadmissível uma mulher à frente de um negócio, ela passou a produzir e contrabandear a bebida, cujas garrafas mantinha escondidas em cavas subterrâneas. Um dia, uma avalanche de neve invadiu seu sótão e cobriu os gargalos das garrafas. Ela teve então a ideia de retirar as leveduras congeladas, degolando as garrafas com um golpe seco de sabre.

Cabe também uma referência histórica ao frei Don Perignon, a quem se atribui a criação dos espumantes, em 1817, um século antes que a viúva Clicquot os tornasse transparentes. Ele produzia vinhos brancos e algumas de suas garrafas explodiam, o que ele acreditava sinalizar a presença do diabo em seu interior. Um dia, seu amigo Napoleão Bonaparte propôs que provassem esses vinhos “endiabrados” e, ao experimentar as borbulhas, exclamou: “estou bebendo estrelas!”. Foi inspirada nessa exclamação que nasceu a marca da Chandon, com sua estrela cadente.

Por fim, mas não menos importante, vale registrar dicas para melhor brindar:

– Os espumantes devem ser servidos sempre entre 6 e 8 graus centígrados

– Os mais secos harmonizam bem com carnes vermelhas e tábuas de frios, além de pescados gordos, como o salmão

– Os rosés casam bem com peixes mais suaves, camarões, frutos do mar, comida japonesa, além de massas e pizzas

– Os rosés ice (mais doces), devem ser servidos sempre com gelo. Neles, pode-se adicionar pepino, manjericão, cascas de laranja ou outras frutas.

– Não é verdade que quanto maiores as borbulhas, maior a possibilidade do espumante embebedar quem o degusta. Apenas o teor alcoólico mais elevado é que aumenta as chances de embriaguez e ele pode ser verificado pela lágrima (resíduo que a bebida deixa nas paredes da taça quando ela é inclinada). Porém, quanto maiores as borbulhas, melhor a qualidade do espumante.

No mais, saúde!

Por Rosana de Moraes, em jun’2017

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