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O Luxo do Chuchu, do Sagú, do Dendê

O Brasil não tem grande tradição no universo do luxo. Como as principais marcas de moda, veículos, cosméticos, perfumes, bebidas finas, e outras tantas, têm origem principalmente em países europeus, o segmento tomou impulso por aqui somente a partir da década de 1990, após a abertura das importações. E ganhou maior força a partir do início dos anos 2000. De lá para cá, o crescimento tem sido expressivo, ao longo de períodos de fôlego e de crises.

Assim, nesse jovem mercado, ainda são poucas as categorias em que nomes brasileiros desfrutem de tradição e reputação internacional e posições de destaque. Na hotelaria, necessário mencionar o Copacabana Palace, fundado em 1923 e hoje nas mãos do grupo Orient Express, e os empreendimentos do grupo Fasano, iniciado também no início do século XX. Na alta joalheria, as mais-que-septuagenárias H. Stern e Amsterdam Sauer.

Mais recentemente, porém, uma nova atividade verde e amarela vem ganhando destaque no mundo do alto padrão, com potencial para construir belas histórias: a gastronomia. No ano de 2016, o D.O.M., comandado pelo chef Alex Atala, em São Paulo, ficou mais uma vez entre os 50 melhores restaurantes do mundo, eleitos pela revista britânica Restaurant. Na América Latina, conquistou o terceiro lugar, acompanhado, na lista, por mais oito nomes: do Rio, Olympe, Lasai e Roberta Sudbrack; Em São Paulo, Maní, A Casa do Porco, Mocotó e Tuju; e, em Belém do Pará, Remanso do Bosque.

Como fruto desse amadurecimento de nossa alta gastronomia, passamos a contar com uma versão verde e amarela do guia Michelin. Nele, nenhuma casa foi ainda contemplada com a premiação máxima de três estrelas, mas o D.O.M. recebeu duas delas e, com uma estrela (que não é pouca coisa), ficaram os paulistas Attimo, Epice, Tuju, Maní, Fasano, Huto, Jun Sakamoto, Dalva e Dito, Kinoshita e Kosushi. No Rio, mereceram uma estrela, Oro, Le Pré Catelan, Roberta Sudbrack, Olympe, Mee e Lasai, tendo sido avaliados apenas estabelecimentos localizados nas duas capitais.

Mas o foco deste texto é uma característica comum a vários dos restaurantes premiados e a outros excelentes nomes do segmento: a (re)valorização de ingredientes e temperos tipicamente nacionais em seus cardápios. Nada mais merecido! Num país com essa extensão territorial e uma variedade tão grande de culturas, climas e, consequentemente, sabores e aromas, é justo, e inteligente, que a arte gastronômica alce ao status de astros paladares que, até há pouco tempo, ficavam restritos aos deliciosos pratos da (injustamente) chamada “baixa gastronomia” brasileira.

E eu, que possuo zero complexo de vira-latas, me encho de orgulho e me divirto ao ver desfilarem, nas mesas mais sofisticadas do país, e saboreados por apreciadores e críticos do mundo inteiro, o chuchu, estrela da “coleção” 2016 de Roberta Sudbrack, o sagu, que me surpreendeu há anos em versão salgada, no D.O.M., o dendê, a barôa, o jiló, o quiabo, o queijo coalho, a barriga de porco e até a pinga, empregados com audácia e elegância por nomes como Morena Leite e Helena Rizo, entre outros.

Fica aqui minha “saudação à mandioca” e aos chefs contemporâneos que vêm redesenhando os paladares brasileiros mais populares. E viva o bobó, o vatapá, o tucupi, o tutu, a tapioca e tudo que temos de mais saboroso – agora em versões criativas e gourmets, palavra para a qual, infelizmente, ainda não há substituta em português!

Por Rosana de Moraes, em dez’2016

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